O encerramento do “Seminário Folha: 40 Anos das Diretas Já”, na sede da OAB SP (Ordem dos Advogados do Brasil Seção São Paulo), nesta segunda-feira (29), levou muita emoção e nostalgia ao público presente. O ato final do evento foi um momento para recordar o contexto das manifestações sob o olhar de quem participou ativamente deste momento histórico do país.
Reunidos no mesmo palco estavam o jornalista Ricardo Kotscho, considerado o “repórter das Diretas”; a cantora Fafá de Belém, uma das principais vozes do movimento; a atriz Christiane Torloni; o colunista Juca Kfouri; o ministro do Trabalho de João Goulart e vice-governador de São Paulo (1987-1990), Almino Affonso; o presidente da OAB SP entre 1987 e 1991, Antônio Claudio Mariz de Oliveira; a atual presidente da OAB SP, Patricia Vanzolini, e o mediador Oscar Pilagallo.
Patricia Vanzolini defendeu a união dos brasileiros. “Há 40 anos, direita e esquerda, progressistas, conservadores liberais, se uniram sem qualquer preocupação com rótulos, sem levantar barreiras ideológicas de uns contra os outros. Se foi possível naquela época, hoje ainda é possível”.
A presidente da OAB SP também destacou a necessidade de uma revisão e uma vigilância constante das instituições. “É preciso olhar para dentro das nossas instituições, para o executivo, para o legislativo e também para o judiciário. E é preciso coibir os excessos. E é preciso olhar para dentro da nossa própria instituição e meditar sobre que legitimidade que tem a OAB para, 40 anos depois, exigir democracia e exigir voto direto se nós não temos eleições diretas dentro do nosso Conselho Federal. Isso não pode mais ser tolerado”, enfatizou diante de fortes aplausos.
Fafá de Belém contou que participou de mais de 40 comícios das Diretas Já e que o movimento ajudou o povo brasileiro a se redescobrir como cidadão. “Eu tenho muito orgulho e que mais encontros como esse fustiguem uma juventude que está chapada atrás de uma tela plana para ter consciência da importância da democracia. A democracia não é ‘eu e eles’. A democracia somos nós, com as nossas diferenças, tentando nos ajudar mutuamente.”
A atriz Christiane Torloni lembrou que começou a atuar no movimento já em 1982, com a abertura política e as eleições municipais e estaduais. “Nós, artistas, que na época éramos quem tinha alguma voz, alguma plateia, fomos de mãos dadas com os retornados ao Brasil de seus exílios, batendo na porta das pessoas. Essa arte do encontro e do diálogo, ela foi feita olhos nos olhos, não tinha internet, não tinha rede, mas existia afeto.”
Aos 95 anos, Almino Affonso falou sobre a força feminina na política e destacou a importância do crescimento da participação das mulheres no processo democrático ao longo das décadas. “O que me toca é a presença da mulher. Há algo de novo no cânone desse país.”
O colunista Juca Kfouri recordou as figuras importantes para o movimento das Diretas Já, como o jogador Sócrates e o editor Caio Graco Prado. “Ainda é possível fazer política com afeto e é isso que nos resta fazer agora, abrir os braços para aqueles que em algum momento se desgarraram, foram contaminados pelo fundamentalismo das mentiras antidemocráticas.”
Ricardo Kotscho, o jornalista que acompanhou de perto as Diretas Já, lamentou que o Brasil ainda não tenha chegado ao objetivo das Diretas Já, que é uma democracia plena para todos. “Por que ainda não temos uma democracia plena no Brasil? Porque não resolvemos até hoje a questão militar. Os mesmos militares que deram o golpe 60 anos atrás, os herdeiros deles, os seguidores deles, tentaram fazer a mesma coisa agora, recentemente. Quase caímos no novo golpe. E enquanto não se resolver isso, a nossa democracia, jovem, frágil, vai estar sempre ameaçada.”
O último a falar foi Antônio Cláudio Mariz de Oliveira, que destacou a mobilização da advocacia nas manifestações de 1984 depois de um longo período de perseguição e resistência durante a ditadura. E fez uma convocação à classe: “Nós, advogadas e advogados, precisamos ter um compromisso perene de estar vigilantes e de, quando necessário for, lutar pela democracia, pela liberdade e pela dignidade do homem, por um Brasil mais justo. É preciso que haja o rompimento de uma bolha, dessa tida elite que não enxerga o Brasil.”
Para encerrar, Fafá de Belém, que trazia a bandeira brasileira na camiseta, reproduziu uma cena muito comum nos comícios das Diretas: ela entoou o Hino Nacional, ao lado dos palestrantes e diante de uma plateia emocionada, que cantou junto e saudou a democracia brasileira.