Direito do Terceiro Setor

20 de junho de 2024 - quinta

Law Summit destaca o avanço da relação entre as organizações da sociedade civil e o Estado

Segundo dia de evento sediado na OAB SP trouxe um panorama das leis vigentes e suas aplicações

Imagem de três mulheres sentadas em uma mesa com microfones.
“Eleições Municipais de 2024 e o Terceiro Setor: restrições e potencialidades” abriu o segundo dia de debates. Foto: Mateus Sales/OAB SP


O painel “Eleições Municipais de 2024 e o Terceiro Setor: restrições e potencialidades” começou no segundo dia de evento. A mediação foi realizada pela presidente da Comissão de Direito do Terceiro Setor da OAB de Ribeirão Preto, Larissa Brito. Como primeira palestrante, a coordenadora executiva do Pacto pela Democracia, a jornalista Flávia Pellegrino, comentou sobre a atuação da plataforma que tem como missão a defesa da construção democrática do Brasil.

Pellegrino também discorreu sobre os desafios enfrentados pela frente democrática. De acordo com a jornalista, o pleito municipal que se aproxima deve apresentar contexto parecido com o que foi visto nas últimas eleições. “Mesmo sendo um pleito local, devemos enfrentar problemas parecidos com os das últimas eleições, entre eles estão a desconfiança no sistema de votação, a ascensão da extrema-direita e os processos de desinformação que seguem crescentes no País”, alerta Pellegrino.

A Diretora do Instituto Alziras, Tauá Pires, corroborou com a visão da jornalista em relação aos problemas enfrentados pelas organizações que defendem a democracia no Brasil. Além das questões citadas por Pellegrino, Pires chama a atenção para a falta de representatividade das mulheres na política brasileira. Como medida para aprofundar a democracia, a diretora do Instituto Alziras defendeu que haja maior rigor na aplicação da Lei nº 14.192, que versa sobre a violência política de gênero. “Desde a implementação da lei, dos 175 casos, tivemos apenas 3 condenações”, argumentou ela.

Na continuidade do painel, o professor de direito eleitoral da FGV SP, Fernando Naisser, sugeriu ações que as entidades da sociedade civil possam adotar em período eleitoral que não firam a legislação pertinente. “As organizações podem formar pessoas para a participação nas eleições, fiscalizar o processo eleitoral, fomentar pautas de incentivo ao voto e contribuir com a elaboração de normas que regulam a atuação das instituições do Terceiro Setor no período eleitoral”, aponta o professor.

A seguir, o advogado Rubens Navas abordou o contexto que estamos vivendo nessas eleições e o papel da advocacia, apoiando a higidez do processo eleitoral. Ainda sobre as potencialidades do tema, Navas citou a Lei Orgânica do Município de São Paulo que prevê a apresentação dos programas de metas pelo Prefeito eleito, permitindo que promessas de campanhas possam ser acompanhadas pela sociedade civil. “A fiscalização das organizações da sociedade civil da Lei Orgânica, por exemplo, é fundamental para que haja o progresso das demandas típicas das grandes metrópoles”, afirmou o advogado.

Encerrando o painel, a advogada Janaina Pereira, da Comissão de Direito do Terceiro Setor da OAB SP, apresentou a agenda regulatória das Organizações da Sociedade Civil para as Eleições Municipais de 2024. A proposta busca um ambiente seguro para a atuação das organizações, por meio das parcerias com as entidades, o combate à criminalização burocrática, a revogação das declarações de utilidade pública e o fomento ao conhecimento.

Um homem e uma mulher sentados à mesa.
10 anos do MROSC trouxe à tona os avanços que a regulação trouxe ao Terceiro Setor. Foto: Mateus Sales/OAB SP.

Gestão pública democrática e valorização das organizações

O segundo painel tratou sobre os 10 anos da lei que definiu o MROSC (Marco Regulatório das Organizações da Sociedade Civil). As palestras foram iniciadas por Tomaz de Aquino Rezende, presidente da Confederação Brasileira de Fundações e membro da Comissão de Direito do Terceiro Setor da OAB SP. Rezende contou sobre a sua experiência como responsável pela implementação do Marco Regulatório do Terceiro Setor em Belo Horizonte, enquanto Procurador Geral do Município. A legislação inspirou o regramento adotado em âmbito Federal.  

O diretor de Parcerias com Sociedade Civil da Secretaria-Geral da Presidência da República, Igor Ferrer, tratou sobre o fechamento de ciclo da lei e o desenvolvimento da nova legislação. Ferrer pontuou as parcerias com as organizações para a implementação de políticas públicas para a elaboração do novo decreto. “O MROSC contou com a colaboração das organizações da sociedade civil (OSC´s) para aprimoramento da regulamentação, com mais de 170 alterações contempladas no novo decreto nº 11.948/2024” , afirmou ele.

Marcelo Panico, presidente do Conselho Municipal de Assistência Social de São Paulo (COMAS/SP), integrante da Comissão de Direito do Terceiro Setor da OAB SP e representante de Advocacy da Fundação Dorina Nowill, apresentou números de pessoas com deficiência no Brasil e a taxa de participação desse público no mercado de trabalho. Panico explica que, mesmo entre as pessoas com nível superior, a taxa de deficientes inseridos no mercado de trabalho é baixa quando comparada com o dado de pessoas sem deficiência. ”A desigualdade persiste mesmo entre as pessoas com nível superior: nesse caso, a taxa de participação foi de 54,7% para pessoas com deficiência e 84,2% para as sem deficiência”, apontou o representante da Fundação.

Mariana Chiesa, membro da Comissão de Direito do Terceiro Setor da OAB SP, também analisou inovações e oportunidades da aplicação do MROSC. Chiesa apontou o controle de resultados, a uniformidade de regramentos e o chamamento público como pontos fortes do Marco. Entre os “gargalos”, a advogada ressaltou a responsividade da legislação Estadual, Distrital e Municipal; a manutenção da declaração de utilidade pública; e a exigência de contrapartida como regra.

Como encerramento, Daniel Mariz, presidente da Comissão de Direito do Terceiro Setor da OAB CE, fez um panorama do antes e depois da constituição da lei 13.019/24 (MROSC). De acordo com Mariz, a ausência de um regramento geral nacional trazia riscos para gestores e para a sociedade. Mudança alcançada com a lei em vigor, portava maior segurança jurídica às organizações da sociedade civil nas parcerias com a administração pública, ao passo em que faltou apoio político para OSC´s. “Apesar dos benefícios trazidos pela lei, nos anos seguintes houve um distanciamento das OSC´s com o poder público, só retomando o diálogo em 2023, com a atualização do Decreto”, avaliou Mariz.

Doações e institucionalização das instituições sociais

Uma mulher com dreadlocks sentada em uma mesa com um microfone.
Carol Farias, idealizadora do Dia de Doar, esteve presente no painel sobre Cultura de Doação e Compliance no Terceiro Setor. Foto: Mateus Sales/OAB SP

A estruturação das organizações sociais no Brasil, da constituição de seus estatutos até a captação de recursos, foram centrais nos debates da tarde do segundo dia de congresso. Sob a visão de que o Terceiro Setor possui regramentos específicos e as instituições são muito singulares, as presenças do painel “Cultura de doação e Compliance no Terceiro Setor” reforçaram a importância de se conhecer legislação para um recebimento de recursos efetivos.

De acordo com Carol Farias, idealizadora do Dia de Doar, 50% da população brasileira entende o potencial das doações, porém, enxerga esse ato como assistencialismo e não como uma forma de desenvolvimento das organizações. Ainda segundo Farias, o brasileiro doa, em média, 17 reais a ações sociais. “Não é só sobre deixar de pagar um imposto, mas é reconhecer a importância da doação livre, através desses pequenos reais”, pontuou ela.

A advogada Ana Carolina Carrenho e a membro da Comissão, Carolina Mazza, evidenciaram alguns pontos da legislação brasileira sob o aspecto da doação como um incentivo fiscal para pessoas físicas e jurídicas. “Nós temos a doação como uma das principais fontes de recursos para as organizações, por outro lado, temos que tomar cuidado para que as doações não sejam tributadas por vias transversas”, apontou Carrenho.

Um grupo de pessoas sentadas em uma mesa em frente a uma tela.
Último painel do dia focou na importância da construção de estatutos, por parte das organizações, que sejam um reflexo de suas propostas. Foto: Mateus Sales/OAB SP

Atrelando ao tema, no painel “Governança e estatutos sociais: planejamento jurídico e contábil” falou-se sobre a importância das organizações sociais construírem estatutos que espelham seus propósitos, sem perder o olhar legal. O Coordenador do OSC Legal Instituto, Lucas Seara “como o documento tem que traduzir o que é a entidade, trazendo para a caixinha jurídica o sonho daquele grupo de pessoas como atuação”, reforçou.

Os membros da Comissão de Direito do Terceiro Setor, Mariana Kcruchin, Carolina Morais e Danilo Tiisel concordaram que o “juridiquês” não pode ser um impeditivo para que as organizações tenham estatutos compreensíveis por todos da instituição. Kruchin destacou a “linguagem como um aspecto relevante da transparência das organizações”. Em complemento, ainda mencionou como a obtenção efetiva de recursos está diretamente ligada a uma organização transparente. “Quando estamos falando de governança, a transparência é um dos argumentos mais eficientes para captar recursos”, salientou o advogado e membro da comissão.

Saiba mais sobre o que foi assunto no primeiro dia do congresso II Direito do Terceiro Setor - Law Summit.


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