Privacidade, Proteção De Dados e Inteligência Artificial

11 de setembro de 2024 - quarta

Liberdade de expressão, proporcionalidade e o desafio da moderação judicial no mundo digital

Por Solano de Camargo, presidente da Comissão de Privacidade, Proteção Dados e Inteligência Artificial da OAB SP

Imagem com um X em destaque, representando o símbolo da rede social que foi banida judicialmente para operar no Brasil. Na imagem está representado também um juiz com um malhete em mãos


Nas últimas semanas, tem-se falado profundamente sobre os desafios impostos pelo bloqueio da plataforma X no Brasil, uma decisão do Supremo Tribunal Federal que impacta diretamente a liberdade de expressão e o ecossistema de comunicação digital. Essa medida, motivada pelo descumprimento de ordens judiciais pela empresa, trouxe à tona questões críticas sobre os limites da moderação judicial em plataformas digitais e seus efeitos sobre os direitos fundamentais dos cidadãos.

Esse caso mostrou que a liberdade de expressão, garantida pela Constituição, não é absoluta. Porém, a forma como essa liberdade é restringida precisa ser proporcional e justificada. Ao impedir o acesso de milhões de brasileiros ao X, não apenas se busca punir uma empresa, mas também se impacta diretamente a coletividade. Milhões de pessoas que dependem da plataforma para se comunicar, trabalhar e participar da vida pública são prejudicadas. Isso inclui, por exemplo, a comunidade científica, que utiliza a rede para divulgar descobertas e trocar informações em tempo real.

Um dos pontos mais preocupantes dessa decisão é o efeito colateral sobre setores essenciais da sociedade, como a ciência e a comunicação. Ao bloquear o X, impediu-se que cientistas brasileiros continuassem suas interações globais em uma plataforma que facilita o engajamento público. A dependência de redes sociais para a comunicação científica é um indicativo de como essas plataformas se tornaram ferramentas vitais no mundo contemporâneo. A interrupção dessas redes é mais do que um mero inconveniente; é um prejuízo real à circulação do conhecimento e à inovação.

Além disso, a decisão de bloquear 22 milhões de usuários levanta questões sobre os riscos de criar precedentes que afetam negativamente a liberdade digital e a participação democrática. As redes sociais são, hoje, arenas de debate público e espaços para o exercício da cidadania. Impedir o acesso a elas de forma tão ampla pode, inadvertidamente, comprometer o direito à informação, o que é essencial para uma democracia saudável.

Outro aspecto que merece destaque é a questão da transparência na moderação judicial. Para que decisões como essa sejam mais eficazes e justas, os parâmetros usados para moderar plataformas digitais precisam ser claros e compreensíveis. A falta de transparência gera desconfiança entre os usuários, e isso compromete a legitimidade de ações tão drásticas. A ampla defesa também se vê prejudicada, já que a decisão afeta indiscriminadamente todos os usuários, sem a devida ponderação de seus direitos.

Esse caso é um alerta para a necessidade de repensarmos como as plataformas tecnológicas devem se adequar às leis locais. O uso crescente de IA para moderação de conteúdo deve ser alinhado com os princípios constitucionais e as legislações de proteção de dados, como a LGPD. No entanto, qualquer solução deve ser desenvolvida de forma cuidadosa, para evitar que decisões judiciais prejudiquem milhões de cidadãos e enfraqueçam a confiança na Justiça.

Embora a moderação e a responsabilização das plataformas digitais sejam necessárias, precisamos tratar cada caso com cautela. As sanções devem ser proporcionais e bem fundamentadas, considerando sempre os efeitos colaterais que essas decisões podem ter sobre a coletividade. O equilíbrio entre o cumprimento das leis e a preservação dos direitos fundamentais é o grande desafio do direito no ambiente digital.


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